As gotas se sobrepõem ao pára-brisa, como tinta guache diluída e lançada sobre uma folha de papel A4, lembrando atividades que fazíamos quando crianças, lepidópteros disformes, que dizíamos ser simetricamente bilaterais, após um assopro no centro da folha. Logo, a nuvem densa passa segundos após o Sol se descobre os canaviais. As gotas ainda se unem fugindo para extremidade do pára-brisa, no caminho se unem às outras em um rimo frenético de fuga, olho para o lado e lá estão as fugitivas se deslocando rapidamente. As que conseguiram ancorar suas ventosas moleculares ao vidro continuam imponentes. As outras fogem ao lado, instáveis.
Neste ritual da água, vidro e Sol, o ar-condicionado esfria os pensamentos, percebo-me ao lado de estranhos. O ambiente urbano logo aparece. Chaminés, fumaça, se já não bastasse os canaviais. Há quem diga que isso é natural, embora veja o uso de diversos artifícios criados pela lógica humana, modus tollens, algo que vai além de simples ações instintivas, e se abrem ao leque egocêntrico, daqueles que possuem, e super-egocêntrico, daqueles tantos outros que censuram, dão "pitacos".
Volto a olhar o pára-brisa, já não restam muitas gotas ali, o ambiente urbano me tomou a atenção do caminho que elas levam para fugir da frente e dos lados vidraçais transparentes que me rodeiam.
Amizades, família, política institucional. Habilito-me a pensar nas gotas unindo para depois se espalharem, por ai, quantos amigos jazem, chego ao quesito família, quantas vezes mais fui visitar meus parentes, e na política, grupos se fazendo e desfazendo, idéias e ideais atropelando, somando , segregando. Algumas gotas persistem, outras logo evaporam, embora nenhuma parte absorvida, que poderiam manter a temperatura. Pobres seres homeotérmicos, quanto desperdício de energia, quando há gotas para nos controlar. Agora, estou chegando perto da fonte.
O mar.
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